Osun Osogbo Nigéria
Dedicado ao meu professor Gilberto Baraúna e às pessoas que realmente se interessam pelo idioma yorùbá, Cultura Afro-brasileira e o Culto Tradicional aos Orísa.
terça-feira, 29 de maio de 2012
domingo, 6 de maio de 2012
O Alaafin de Oyó -
artigo da revista inglesa Focus
Ele, o Alaafin do
reino de Oyó, Alaiyeluwa Oba (Dr.) Abdul Hameed Olayiwola Adeyemi III,
é um monarca com classe.
É um enigma para
qualquer referência, e a oportunidade de encontrá-lo é como uma aventura
através de uma aula de história.
Esse monarca
essencialmente urbano, que trabalhou como corretor de seguros antes de atender
ao chamado natural dos deuses, através do Oyomesi para subir
ao trono de seus antepassados como Alaafin do maior reino da historia da raça
negra- O Reino de Oyó - é um homem sempre à vontade consigo mesmo, e que exala
confiança em todas as suas ações.
Uma das
características brilhantes desse grande monarca é o profundo conhecimento e
precisão para recontar eventos históricos com personagens e fatos; e com uma
precisão que surpreende a imaginação da jovem intelectualidade.
O Alaafin apesar
de sua idade, ainda se lembra de fatos ocorridos a mais de cem anos atrás, e
ainda escreve seus roteiros sem ajuda.
Ele é um leitor
consumado que poderá passar qualquer dia por um mestre de historia e
arqueologia moderna e antiga.
Ele conversou
recentemente com a equipe editorial da Focus, em seu amplo palácio, de uma
variada gama de assuntos, concentrando-se principalmente na rica herança do
reino de Oyó.
Sejam benvindos à
essa excursão histórica!
Focus:
Kabiyesi nos gostaríamos que você
recontasse a história do famoso reino de Oyó para o proveito de suas crianças
na Diáspora.
Alaafin:
O velho Império de
Oyó era formado por uma das primeiras e provavelmente, a maior raça
independente na África ocidental, ao sul do equador. No auge de sua existência,
o velho Império dominava todos os reinos Iorubas como Ifé, Ijesha,
Egba, Ijebu , Sabé e Owu. A área ocupada pelo reino Ioruba no sudoeste da
Nigéria esta contida aproximadamente na latitude de 5 a 8 graus ao norte do
equador e 5 a 21/2 graus de longitude ao leste. Existem duas versões para a
origem da raça Ioruba- a migração e forma aborígine. Essas duas teorias não são
necessariamente contraditórias pelo fato de que nossa tradição oral foi trazida
por povos essencialmente estrangeiros.
Mas esse fenômeno
é universal uma vez que você pode ter ao mesmo tempo brancos na África do Sul;
as Rodesias do sul e do leste, convivendo juntas ha muito tempo. A mesma experiência
esta registrada no caso das migrações, pelas evidencias históricas e empíricas
documentadas nas famosas conferências das series Lugard, assim como nas
pesquisas de Saburi Biobaku (um historiador reverenciado mundialmente) que a
raça Ioruba é tão grande e espalhada, que ainda se considera nos dias hoje em
dia como um dos maiores e mais fortes impérios que já existiram, em todo
continente africano.
O reino de Oranmiyan marcou
uma nova etapa na história Ioruba, por testemunhar a transferência do poder
politico de Ilê - Ifé para Oyó, e dai em diante Oyó tornou-se o centro politico
da raça ioruba, aonde governa o Alaafin.
De acordo com
estudos históricos, estima-se que o palácio de Oyó tenha tido uma área de
aproximadamente 640 acres de terra. Ainda temos escavações do velho Império de
Oyó, e algumas das paredes ainda estão de pé na sua forma original, durante
todos esses séculos. Esse é um grande testemunho da engenhosidade arquitetônica
da raça Ioruba.
O velho império
Ioruba distinguiu-se dos demais por três motivos principais.
Primeiramente
desenvolveu uma Constituição magnífica, apesar de nunca ter sido escrita. O
povo era governado por uma forte cúpula.
Em segundo lugar
os iorubas, desenvolveram um sistema militar que lhes permitiu aperfeiçoar o
material bélico. Os Iorubás formam os primeiros ferreiros, construindo as
primeiras fundições onde também produziam implementos agrícolas para expandir a
produção de alimentos.
Em terceiro lugar
desenvolveram um método bastante prático de administração, adotando um sistema
de governo de gabinete. Se você conhecer a historia da Constituição Britânica,
ira perceber que o sistema de gabinetes surgiu apenas como uma forma de
expediente temporário, e não por desígnio. Portanto, voltando ao século XVI,
foi no velho Império de Oió é que foi criado o sistema de governo por Gabinete.
E do Primeiro Ministro ao Alaafin, dos vários chefes de divisões, todas as
camadas tem suas funções e responsabilidades claramente definidas, e mantidas
com separação de poderes, fiscalização e balanço.
A estrutura do
comando militar é tão excepcional, que os Aare Ona Kakanfo,
generalíssimos do poderio militar, tenham conduzido com sucesso os senhores da
guerra de Oyó nas muitas batalhas entre os séculos XIII e XVI para preservar a
integridade territorial da raça Ioruba.
Durante esse
tempo, Oyó estendeu suas fronteiras ate os limites de Nupe, Daomé,
Abomé, Wema, e outras partes do Togo. Esses povos são as atuais crias do
grande reino Ioruba.
Focus:
Pode-se dizer que
essas áreas anexadas foram parte de um plano expansionista?
Alaafin:
Eu não vou dizer
que seja. Mas veja você, se estiver rodeado de vizinhos hostis, tem que estar
vigilante. Treinamos nosso exercito para defender todas as agressões externas,
assim como para proteger a nossa integridade territorial para termos paz e
prosperidade econômica. E para os Iorubas que são comerciantes natos,
caminharem ate seus negócios sem sentirem-se inseguros , enquanto houvesse um
Alaafin governando, haveria necessidade de espalhar nosso poderio militar para
proteger nosso povo em toda parte.
Quando o Daomé
atacou a pequena província de Wema em 774, os chefes reais refugiaram-se em Oyó
para se proteger.
O Alaafin teve que
organizar forças para recapturar a cidade, e foi assim que naquele tempo, o
Daomé ficou sob o controle do Alaafin.
Isso não podia ser
chamado de expansionismo, e sim a resposta para a agressão por outras forças
que ameaçavam a existência das pequenas províncias. Se você ler nos livros de
história, vai perceber que a mera menção de “Alaafin ou Oyó” causava medo nas
cidades vizinhas.
Devido a sua rica
história cultural, politica, linguística e tradicional, ha muitas coisas que
Oyó proporcionou para a nação Ioruba. A língua que falamos é a autentica versão
do dialeto Ioruba, os tambores, as roupas que usamos, a maneira como
construímos nossas casas, nossos engenhosos sistemas de corredores, e nosso
sistema de drenagem que foi criado ha muitos séculos atrás. Pode-se dizer que a
civilização se iniciou com a raça Iorubana. Os iorubas estabeleceram contato
com os portugueses nos idos do século XVII, e o Alaafin manteve seu embaixador
na corte de Portugal desde então.
Focus:
Kabiyesi, você
disse que a civilização começou aqui. Poder-se-ia dizer que os Iorubas eram Oyó
e vice versa?
Alaafin:
Os Oyós não
eram chamados originalmente de iorubas. Outros grupos da raça ioruba se
designaram naquele tempo, (séculos atrás) como Egbas, Ijeshas e
quaisquer nomes que preferissem. Mas no século XIX, não havia mais motivo para
forjar um terreno comum e ter um padrão linguístico, portanto o dialeto Oyó foi
adotado por todos Iorubas. Por isso os Iorubas são Oyós na sua
origem.
Focus:
Muitos jovens
Iorubas acham que uma cidade como Ilorin deveria estar sob o reino de Oyó. E
recentemente alguns chefes foram promovidos como chefes tradicionais mais
conceituados. Qual é o ponto de vista deKabiyesi?
Alaafin:
Veja você, a agua
vai sempre encontrar o seu nível, e a história é muito potente, mesmo que
tentemos faze-la submergir. É como água e sangue, e você também sabe que sangue
é mais denso que a água. Ilorin foi sempre uma cidade
Ioruba. Afonjá foi enviado como generalíssimo dos soldados
Iorubas, para proteger e aquele lado do reino de Oyó, da invasão dos Fulani e
dos Nupes.
Por algum motivo
ele se tornou muito ambicioso e convidou os grupos dissidentes para o seu
campo, excluindo-se dos grupos étnicos maiores. Percebendo que ele os havia
traído, o contingente ioruba organizou um golpe e o depôs.
A história de
Ilorin está bem documentada. Não ha lugar nenhum na África que você possa
encontrar um Fulani reclamando a posse de Ilorin. A língua, a cultura,
nomenclatura, e mesmo as tradições de Ilorin são Iorubas. Não ha disputa sobre
esse fato empírico.
Focus:
Como é que vossa
Majestade administra esse amplo palácio? Recebe fundos do governo e por qual
motivo esse palácio não desenvolveu o status de atração turística?
Alaafin:
Bem, eu escrevi
muitos memorandos para o governo declarar esse palácio um monumento nacional.
Primeiramente como a principal atração turística e, além disso, para o povo.
Podemos perceber de longe ingenuidade arquitetônica do nosso povo, portanto
todas essas coisas não estão perdidas, para o beneficio das gerações atuais e
vindouras.
Quando o professor
Armstrong (um americano) que foi o diretor do Instituto de Estudos Africanos de
Ibadan, leu o memorando, ele veio aqui. Eu o conduzi pelo palácio , e pelos
subterrâneos que permitem ao Alaafin circular sem ficar exposto aos raios de sol
e a chuva. Ele ficou maravilhado, e subsequentemente enviou um relatório para o
Museu Nacional, mas por conta da situação politica no pais naquela ocasião, não
resultou em nada.
Ate o momento os
governos sucessivos não se decidiram como vão fazer para preservar essa rica
herança da raça Ioruba. Transformar num monumento nacional ou numa atração
turística, não parece ser a prioridade no momento.
Sua outra
pergunta, a administração e manutenção do palácio tem sido tem ficado nas mãos
dos funcionários que trabalham nas divisões administrativas. E o estado paga o
salário do Alaafin, assim como as despesas do palácio. O Alaafin não tem
necessidade de gastar seu dinheiro para administrar o seu palácio, se assim
quiser.
Mas como se pode
notar o palácio é uma mera sombra daquilo que foi no passado, nos tempos
coloniais.
Focus:
Qual é o processo
de ascendência ao trono do Alaafin?
Alaafin:
Existem duas casas
regentes principais, que são reconhecidas para gerar um Alaafin. No processo de
transferência de poder de um Alaafin, a coroa é dada para a outra casa regente.
O primeiro Alaafin de Oyó, Oba Atiba, formou uma convenção
constitucional dos Iorubas, antes de falecer, para discutir o processo
sucessório para que quando morresse a questão sucessória não fosse
interrompida. A conferência concordou que um Aremo(príncipe
coroado) que normalmente morreria junto com seu pai, não seguisse mais essa
antiga tradição. E se fosse capaz e valoroso pelos Oyomesi (os
fazedores de reis) para ser indicado como Alaafin, ele seria coroado. Outros
aspirantes ao trono, elegíveis e vistos pelos Oyomesi como
qualificados para carregar responsabilidades pesadas, seriam apontados para a
regência.
Com a morte
de Atiba, Kurumi , o Aare Ona Kakanfo daquele
tempo (sec XV) renegou suas atribuições. Mas outras nações Iorubas discordaram
dele, para que a sua indicação fosse sustentada. Isso motivou a guerra de
Ijaiye, que ceifou a vida dos Kurunmi e todos seus cinco filhos. Por esse
motivo a sucessão do trono voltou-se para as duas principais casas
regentes Ladigbolu e Adeyemi.
Focus:
O que Kabiyesi pensa
que é necessário fazer para tornar mais relevante a instituição tradicional
para a sua nação em termos políticos?
Alaafin:
A instituição
tradicional tem contribuído para o discurso politico da nação. Alguns de nos
tivemos problemas, especialmente durante a era Abacha, por sermos muito
audaciosos e francos. Apesar de nosso oficio como Oba não participar em
politica, nos fazemos relevantes na realidade politica do pais oferecendo
conselhos construtivos aos lideres.
Nos temos canais
através dos quais atingimos as autoridades. Usamos tanto diplomatas quanto
contatos pessoais para darmos nossas sugestões, com a finalidade de aprimorar a
nação. Fica para eles a decisão de aceitar e agir por esses aconselhamentos.
Retirando do rico
reservatório de conhecimento e sabedoria dos nossos antepassados, Eu acredito
que estamos estrategicamente colocados para fornecer aconselhamento para os que
estão no poder, e guia-los para tomarem boas decisões. Isto porque, ontem hoje
e amanhã estão ciclicamente relacionados. Hoje é o futuro de ontem, e para
amanhã, hoje será o passado, portanto para que sejamos relevantes, olhamos
substancialmente para aquilo que aconteceu no passado e dai retiramos nossas
sugestões.
Não estamos
competindo com nossos filhos e filhas que detém o poder politico na atualidade,
mas numa democracia, onde a utilidade de nossas soluções pragmáticas para
problemas, da maneira como foram experiências pela instituição tradicional, não
deve ser sobre enfatizada. A instituição tradicional é bastante relevante nesse
esquema, porque está mais próxima das raízes, onde reside o poder das massas.
Os governantes tradicionais são reverenciados e tomados em alta estima,
tendendo a ter mais aderência e controle sobre a população.
Como pais
tradicionais da nação não cessaremos de aconselhar concretamente e sugerir para
as autoridades, no beneficio de nosso povo. É com eles escutar-nos ou agir de
outo modo.
Focus:
O que VM. fazia
antes de ascender ao trono de seus antepassados?
Alaafin:
Eu era um corretor
de seguros antes de me tornar o Alaafin de Oyó. O concurso para a minha
indicação para Alaafin começou em 1968. Fui convidado junto com dez outros
candidatos de minha casa regente que concorriam para a vaga no trono. Minha
candidatura foi aprovada pelos canais competentes, (através de Babayaji, que é
a cabeça mor da princesa). Ele nos levou para Oyomeji analisar e passamos por
uma serie de procedimentos.
Ha três parâmetros
pelos quais somos julgados. O primeiro é a elegibilidade, que é a nossa
proximidade com a coroa. Em segundo lugar a popularidade, e em terceiro a
capacidade de carregar a responsabilidade no oficio de Alaafin de Oyó. Fomos
colocados diante de uma rigorosa observação e questionário no fim dos quais eu
obtive sucesso.
Entretanto, o
governo na época se recusou de me dar o endosso para minha indicação, dizendo
que o procedimento não estava correto, mas nos sabíamos que aquela ação era
mais politica, devido aos aborrecimentos com meu falecido pai, quando tinha
sido Alaafin.
O processo
recomeçou novamente, no entanto Oyomesy me selecionou, e pela
segunda vez Eu fui recusado na aprovação do governo. Uma imensa pressão foi
depositada sobre Oyomesy contra minha escolha porque o governo tinha investido
interesse no seu próprio candidato. Mas Oyomesy ficou firme! O
processo foi colocado em seguida em ponto morto, até o termino da guerra civil,
quando começaram a afrouxar. E Oyomesi me selecionou de novo.
Fui escolhido
pelos fazedores de reis no dia 18 de Novembro de 1970 e o governo aprovou e
promulgou a minha coroação em Dezembro de 1970, e eu me mudei para o palácio
apos completar os ritos necessários.
Durante o
processo, somos introduzidos nos mistérios de vários deuses, como Ifa e Xangô.
Também somos preparados para nos tornarmos os representantes diretos dessas
divindades na terra. Você é iniciado para aprender os cânticos, os provérbios e
os Orikis de todos os Obas antecessores.
Você tem que ser capaz
de conhecer as canções que louvam Ifa, assim como compreender os sons e os
tambores de todo o território Ioruba, tais como Bata, Apekpe, Gangan,
Dudun, Shekere, e Agogô. Somente após o domínio desses tópicos é que você é
coroado.
Fui coroado numa
cerimonia impressionante no dia 14 de Janeiro de 1971.
Focus:
Kabiyesi, VM. costumava lutar box,
ainda pratica?
Alaafin:
Eu também corro
jogo futebol, mas as pessoas me conhecem mais pelo box. Já obtive prêmios
nestes e noutros esportes. E ainda corro e faço caminhadas. Faço por volta de
seis quilômetros diários quando o tempo permite, e não tenho compromissos
oficiais, nos sábados e domingos. Eu ainda me seguro bem. E devido solicitação
da minha responsabilidade, tento não ter momentos de monotonia na minha vida.
Tenho boa saúde.
Focus:
Qual a comida
favorita de Kabiesy?
Alaafin:
Como Amala,
Abula e Ogi. Comida normal, simples!
Focus:
Existe algum
choque entre a sua fé como muçulmano e as solicitações de seu oficio da
tradicional custódia a suas heranças culturais?
Alaafin:
A raça Ioruba é
das mais organizadas no mundo. Somos liberais no sentido de que não é permitida
à religião galgar o governo.
Eu não me incomodo
qual a fé que você pratica, dentro do meu gabinete de Alaafin, o que me importa
é a sua contribuição para melhorar a nossa comunidade. Isso é essencial.
Como pai de todos
os Alaafin pratica sua própria religião sem discriminar ninguém na escolha de
sua inclinação religiosa.
Posso recitar o
Corão assim como fazer referências à Bíblia. Mas também me sinto à vontade com
os sacerdotes de Ifá assim como posso me comunicar com as divindades de Xangô
nas suas próprias línguas.
Sou liberal
naquilo que concerne à religião. Mas não brinco com minhas preces como
muçulmano porque eu aprecio muito o Corão. Deve ser do vosso interesse saber
que fui criado num lar estritamente cristão, em Lagos, onde também frequentei
uma escola católica. Sou uma livre mistura.
Fonte:
Focus Magazine
Assinar:
Postagens (Atom)